quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Quando o velho lança seu olhar para trás

Quando após mil noites de calor o choro teve de ser engolido para aquecer seus ossos fracos, o velho sentiu na pele o suor fresco dos amores de uma vida toda coçar os sulcos dos estragos que os anos lhe causaram. Não ia tão poído mesmo com todo o sereno da volúpia infernal e dos desejos imundos,mas sentia o amarelecer dos dedos tão ácido que podia jurar por amor à vida não tragar mais o fogo eterno dos ébrios.
Ao lançar seu olhar para o passado, o velho sentiu-se tão só como o dia em que viu o mar pela primeira vez. As águas que tantos anos levaram para acumular a maior de todas as belezas choviam sem mais nem menos só para fazê-lo entender que todo corpo deve submergir por completo em grandezas mais profundas que sua própria existência para só assim sentir o grande frescor da vida.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Considerações acerca do encontro com um tal Espólio Imaculado

Cria-se muito nos ares da destruição pois certos hábitos abandonam a forma para respirar o conteúdo. Tinha o mesmo sangue que corria pelas ruas lavadas todo fim de tarde por pés certos e desalmados que lavam as impressões de todo andar que anda errado no mundo. Corria destes certos e destes desalmados, corria sem fôlego como um trago no fumo de um pulmão que arde, trilhas incertas longe sim da sobriedade pois não lhe diziam nada que lhe valesse motivo suficiente para crer que ser errante nestas encruzilhadas podia oferecer desvantagens maiores e mais horrorosas do que ter de caminhar por ruas em que o sangue se esvai com a água para todo o esgoto do esquecimento, de tal forma que a redução da rispidez truncada de um andar cambaleante de nada poderia dedicar tempo gasto de filosofia.
Conheceu Espólio Imaculado na fumaça densa dos estranhos bares quando este lhe disse que também corria, evoluindo ainda ao ponto de sustentar a tese formulada sob longas horas de balcão que enganoso é ocorrer pensar na incoerência que o correr acarreta na vida de alguém que se dedica a desconstruir. Engano aceitável talvez, pois visto que o mundo corre, a desconstrução viria de um andar com calma segundo os mais sensatos, e essa é de fato uma resposta que se encaixa, mas não a preferida de um crítico ansioso, pois eis que a rechaçava. - É preciso mais - dizia com a voz dos bares - suspiram estes corações a beleza inútil do celebrar a vida, mas que vida se celebra? – e agora com a voz dos agitadores – É preciso cheirar lençóis molhados nos quartos dos amantes para entender a vida e correr pra gozar devagar pois que não se goza parado!

E os errantes se perderam, retomando cada um a sua trilha incerta pela fumaça densa dos estranhos bares pois todo errante é solitário.
Foi assim que conheceu Espólio. Logo depois,com voz de ressaca, um gutural clamor por café sucedeu o encontro de bucaneiros em Tortuga.