terça-feira, 23 de setembro de 2008

O Cárcere

O pior erro do rebanho é achar que o mundo vai até onde a vista alcança.
Quanta graça desperdiçada dia após dia por esta vasta legião que arrota as migalhas jogadas como ração, pelos bondosos pastores, redentores e mártires, mercadores do mundo sacro. As vastas nuances de distantes montanhas, que ao Sol mudam de tonalidade, ricas e belas, poderosas em sua espontaneidade, rebaixam-se à imagens desfocadas de uma lente sanguinária, interprete da língua mortífera amplificada às almas perdidas. Florestas tornam-se pastos mastigados por bocas obedientes.
Entretanto, a vida que pulsa no ventre magro dos famélicos da terra suplica a morte. A imagem do pastor pisoteada por um rebanho que não é mais de sua posse, esta sim é a suplica dos povos, é a graça recuperada de uma harmonia perturbada. O desejo urgente da germinação floresce exatamente no terreno mais árido,e senti-lo, sentir furiosamente este desejo que é tão delicado, sensibiliza apenas os que esticam bravamente os pescoços para ver as cores da montanha além das cercas frouxas.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

A Vila

Muito lhe foi dito acerca da perspectiva de gozar com seus próprios sentidos. Tocar-se em êxtase, contrair as volúpias de ser ébrio exige, entretanto, um alto nível de notoriedade frente à divina providência, concedida exclusivamente aos fétidos monarcas esmagadores de consciência. Só o flagelo lhe é próprio. Procura por vezes, cores e aromas que preenchem visivelmente os arredores do castelo, sentindo porém que a atração baseia-se apenas em provar por instantes o néctar desconhecido. Não deseja possuí-lo pela eternidade pois não saberia, ao fim da vida, educar seus filhos em um pátio que seus pés não reconhecem. O castelo é místico pois lhe é negada a entrada. A porta que detém as sagradas arcas atrai, e esta é sua exclusiva função, seu grande motivo de existência: Situar posições. Inspira orgasmos que nunca serão gemidos e assim eleva-se em seu pedestal, suprimindo do alto de sua cátedra o morador da vila, dono apenas de suas próprias aspirações. Puro e simples, o habitante encara por horas a cerca e padece do mesmo mal que esgota seus companheiros, o único sentimento a que lhes mantém vivos: esforçar-se em todas as dimensões para que os pedaços de mármore depostos venham a compor as lápides reais, a morada coletiva de todos os monarcas deste pútrido castelo.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

MIRA! O DESFILE VEM DE ONDE??

Infeliz surpresa... todos compartilham o mesmo processo.
Ter de desconversar quando lhes perguntam o próprio nome,
ter de desconfiar a cada sorriso amarelo.

Esta Cria há de trabalhar
ôô se há...

Veio ao mundo desfilar pelas centrais, pelos centrões,
ser amassada nos vagões de uma Estácio qualquer,
chacoalhando no ritmo do cão.

Mas ela há de enxergar
ôô se há...
que sambar só se aprende do lado de cá!

Malandragem contida um dia se vira...
...cala o sorriso do tal amarelo,
arrancando a lama da sola do chinelo.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

REFORMA

Deixa estar...
a velha casa ganha sua nova pintura
paredes e janelas já não trazem marcas.
O cheiro forte do cigarro vai embora
Uma outra camisola veste este doente em sua maca.