quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Cidreira

Neste ramo de cidreira sob chuva escorre o torrão gelatinoso de vida mole.

Observa e deita na varanda o espírito nu com fogosa pele de amante.

Deita um tremor de membros e a vontade surda de que a vida seja Vida.

Vê como deixa levar as folhas mortas,como sacia a sede das paixões
e como exige raízes firmes para sustentar o cheiro doce frente as águas que vão.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Em frente a casa de Lorca

...em gratidão à beleza de uma foto.

Flor.

Com as ervas que sobem brancas pelas paredes, tua casa jardim do poeta pede silêncio ao menino que escuta de olhos cerrados.

Verdes portas são estas que abrem uma vida também minha para clarear o tempo de páginas vividas em amarelo num trópico onde os sonhos não deixam de te desejar.
Por ruas pequenas que abrigam teus passos ensolarados, a poesia tem seu ar de canção do campo que roga por amor que não tentem lhe decifrar pois que é seiva fina de ilusão, tonta para que andemos tontos sorrindo aos bancos frente às Granadinas Barracas de toda sorte.

A poesia é algo que anda pelas ruas. Que se move, que passa ao nosso lado. Todas as coisas têm o seu mistério e a poesia é o mistério que contém todas as coisas.*

É teu vestido branco sorrindo um pequeno poema infinito embebido do azeite quente de todas as almas livres do mundo.

Acredito.
A casa do poeta é seu jardim.




* trecho de Garcia Lorca

Povo que ri

Em uma terra seca.
Sangue coagulado
de um roxo que não vive.

Áridos debaixo de temporal
povo e lona
de um preto que se confunde.

Há sempre sopro quente
de café e de luta
e sem porém há raiva.

Que une.
Que chora.
Que junta.

Junta sonhos, braços,
junta medos, esperanças,
junta cores e luz.

E eis que alguém grita
e outro alguém que ergue a alma
e tudo se move e é mais uma terra plantada.

Já não é mais seca
Já não é mais dor
Já não é mais morte.

Vida que vence
Luta que cria
Povo que ri.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Das ruas que cresci

Subúrbio de eterna infância.
Um caboclo recusando sela à beira do congá
fuma, canta, dança, xinga e luta
vê folha verde na poeira da rua.

domingo, 12 de setembro de 2010

Fim de expediente

Sentou o mundo naquela mesa com seu velho hábito de beber sozinho o ácido e absurdo costume de viver.
O calor vermelho pingado de odores do trabalho jovem criou uma atmosfera rude de barba que coça áspera como se quisesse manter distância da leveza pueril, ou de qualquer outra aproximação cotidiana, mas ao invés de afastar, reunia ébrios novos que não paravam de ser cuspidos dos mais variados instrumentos de tortura. Uma tortura em comum que ligava os corpos maltratados a uma brisa seca de revolta.
Mais forte que o torpor do álcool, raiva que vence a triste misantropia.
Bons ventos, mesmo que grosseiros.
Ar carregado de chuva que não demora a cair.